Já faz tanto tempo que nem sei…
Eu tinha uns dezessete anos. Estava no banheiro, com a porta aberta, me penteando, de fronte a um grande espelho, quando vi o reflexo do meu pai passando pelo corredor, carregando um “carneirinho” no colo! Corri para ver de perto tamanha novidade! Afinal, estávamos na cidade grande, em pleno Rio de Janeiro...
Qual não foi a minha surpresa ao ver que não era carneirinho coisa nenhuma! Era um cachorrinho de pelos branquinhos enrolados, apenas com uma manchinha no alto da cabeça e as orelhinhas amareladas. Olhando mais atentamente percebi que também não era um cachorrinho. Era fêmea: uma linda cachorrinha mestiça. Aquela carinha de vira-lata não negava sua mistura!
Eu e minha irmã não escondemos nosso contentamento com a chegada daquela criaturinha, pois sempre amamos os animais. Além disso, toda criança e adolescente sempre têm esse mesmo desejo de ter um bicho para chamar de seu!
Pena que as mães não sentem o mesmo… A minha logo torceu o nariz. Mas meu pai fez sua vontade prevalecer e a cachorrinha acabou ficando. Afinal foi ele quem a encontrara na oficina mecânica, onde ele trabalhava. Aparecera no meio das máquinas, ainda filhote, toda suja de graxa, com um semblante assustado.
Recebeu o nome de Martinha, que herdou de uma outra cachorrinha, igualmente simpática e muito querida, que havia morrido anos atrás. Era de nossa tia Conchita, e era o mais próximo que a gente podia considerar de “nosso bichinho de estimação”.
Nome melhor que aquele não havia!
Martinha tinha uma característica: não tinha rabo. Não sabemos se nasceu assim ou se foi vítima da violência humana. No lugar do rabo apenas uma pelugem mais espessa. Quando queria abaná-lo, sacudia o traseirinho todo. Era uma graça! Ela era uma cachorra alegre, mas muito levada.
Enquanto filhote aprontou um monte de travessuras. Arrancou todos os botões do quimono da Vovó Dora, que estava pendurado no varal, durante a noite. Não deixou um só para contar a história! Deixou em frangalhos a capa da máquina de lavar e fez questão de espalhar os pedacinhos por todo o quintal!!! Que danada!
Martinha adorava correr. Corria com bastante velocidade e, ao chegar ao fundo do quintal, batia com as patas dianteiras na parede e dava um salto para fazer a curva, tal como uma nadadora faz na piscina, para retornar. Eu e Simone ficávamos admiradas com sua performance. Ninguém a ensinou. Ela desenvolvera a habilidade sozinha! E era muito ágil.
Fazia xixi e cocô no jornal e nos obrigava a lavar aquele canto do quintal, todos os dias. Haja creolina!
Martinha era cachorrinha de quintal. Quintal acimentado, diga-se de passagem. Ela sabia que não podia entrar dentro de casa. Pelo menos, quando nossa mãe estava lá. Pois quando saía... lá vinha Martinha teimando com a gente e entrando porta à dentro! Quem tirava? Ela fazia “corpo pesado”, rosnava pra nós e se empoleirava bem em cima do sofá! Que cachorra atrevida!
Bastava minha mãe abrir a porta, chegando de volta, que ela saía em disparada lá para fora. Esperta, não? Mas não adiantava, a mãe sentava-lhe boas palmadas pela travessura! Não era respeito, era medo mesmo... No fundo, Martinha sabia quem mandava! E a gente também...
Um dia, não sabemos bem como, Martinha escapou pela porta aberta e fugiu para a rua. Resultado: foi atropelada. O carro literalmente passou por cima dela. Para nossa sorte, o carro era alto e ela ficou exatamente no meio, sendo ferida apenas de raspão no alto da cabeça. Ainda assim levamos ao veterinário, mas tudo foi somente um susto.
Eu teria muitas histórias para contar sobre nossa amiga canina Martinha, que foi fundamental na minha vida e na da minha irmã. Ela não foi comprada, nem foi escolhida. Ela veio para nós e deixamos que ela ficasse.
Talvez de tudo que vivemos com ela o principal foi a troca de amor verdadeiro e inesgotável! E sem falar na companhia fiel de todos os dias, o zelo sem fim... Se a gente chorasse, ela estava ali, querendo lamber nossas lágrimas, afagando nosso pranto. E deitava sobre os nossos pés, esquentando-nos com o seu calor…
Quando Martinha partiu eu não estava mais em casa. Ainda bem... Só recebi a notícia. Se já doeu daquele jeito, imagina se eu tivesse acompanhado seu sofrimento?!
Hoje, quatorze de março é o Dia dos Animais. E através das doces lembranças da minha única cachorrinha homenageio todos os bichos da Terra e todos aqueles que, como eu, são por eles apaixonados!
(Para Simone e Maria Clara)
Lindo texto!!! Só quem já teve um animalzinho sabe o tamanho do amor! Beijos, Dê!
ResponderExcluirUm cheirinho pra vc tbm!
ResponderExcluirFiquei emocionada com seu texto,muito bem elaborado, vc é de +!!!