(Texto de Kleber Galveas*)
“A Festa da Penha é a festa religiosa mais tradicional das Américas. Acontece há 446 anos, desde 1570. Falhou apenas dois anos (1938/39), proibida na fase mais negra da ditadura de Getúlio Vargas.
Quando Frei Pedro Palácios chegou ao Espírito Santo (1558), conventos gozavam de enorme prestígio. Dois anos antes, Carlos V, o maior líder político do mundo naquele tempo, Imperador do Sacro Império Romano, havia abdicado em favor de seu irmão e filhos. Viúvo retirou-se da vida pública, ingressando num convento.
Para celebrar a primeira festa, Pedro Palácios mandou buscar em Portugal a imagem de Nossa Senhora da Penha, ainda venerada no altar-mor. Em uma caixa chegaram a cabeça, as mãos e o Menino Jesus. O frade improvisou o corpo com madeira da mata e pôs-lhe vestido e manta.
Em 1653, o Menino foi levado por saqueadores holandeses. Só voltou ao colo da Mãe após entendimento com Pernambuco, local onde foi abandonado pelos sequestradores.
As principais obras, conferindo à igreja imponência de castelo, foram realizadas do séc. XVII ao XIX, a expensas do fluminense Salvador Correa de Sá e Benevides. Em 1652, ele fez doação de “ordinária anual de trinta cabeças de gado”, mantida por seus descendentes até 1846. Em agradecimento, o Prelado-Mor da Bahia concedeu-lhe e aos descendentes o título de “Padroeiros Venturosos do Convento”. Durante quase 200 anos os festejos da Penha só começavam com a chegada da Romaria de Campos, vinda por mar.
O Convento alcançou o aspecto atual no princípio do séc. XX, quando ganhou (após tombamento pelo Iphan) a grande chaminé da fachada norte.
O altar-mor, em mármore de Carrara, foi benefício do paulista Cícero Bastos ao genro, governador Jerônimo Monteiro, autor do “Veto da Penha” (vetou, em decorrência da Constituição Republicana que separou a Igreja do Estado, uma ajuda financeira ao Convento, aprovada na Assembleia Legislativa e apoiada pelo povo). A decisão foi dificílima, deu falatório. O Bispo do Espírito Santo era seu irmão e conselheiro.
Na preparação do altar para a inauguração (1910), a família do governador tomou para si o encargo. Quando foram arrumar a imagem de Nossa Senhora da Penha, viram que ela estava careca. Havia sobre sua cabeça apenas lenço e coroa. Uma cabeleira foi providenciada: cortaram as tranças de uma das sobrinhas do governador. A menina chorou, mas foi consolada pela babá que garantiu: “Não chore minha fia. Você deu o cabelo, ela lhe dará boa cabeça.”
A menina era Maria Stella de Novaes, nossa cientista maior, historiadora, escritora, educadora, pintora e iniciadora de Augusto Ruschi nos mistérios das orquídeas, o que o levou aos (polinizadores) beija-flores e daí à ecologia.
São diferentes os motivos que conduzem ao Convento da Penha. Prevalece o espírito religioso buscando um lugar para orar. Alguns sobem o morro para apreciar belas paisagens; outros buscam referências geográficas para facilitar seus movimentos nas cidades próximas. Estudiosos e curiosos apreciam a arquitetura, as esculturas e as pinturas.
Entre as pinturas destaca-se “N. S. das Alegrias”, tela que há mais tempo está exposta ao público nas Américas. Provavelmente obra do Mestre de Santa Auta (Portugal), trazida por Pedro Palácios em 1558.
A Festa da “Virgem de Guadalupe”, padroeira do México e da América Latina (1945), só foi instituída em 12 de dezembro de 1754, embora a imagem da “Virgem de Guadalupe”, milagrosamente estampada (vários especialistas afirmam não ser uma pintura) sobre poncho de tilma (tecido frágil feito com fibras de agave), tenha sido apresentada ao Bispo, em 1531, pelo índio São Juan Diego, proclamado santo por João Paulo II.
Desde 1570 comemoramos a Festa da Penha. Ela é a festa cristã pioneira da América.”
(*Pintor -Tel.(27) 3244 7115 - www.galveas.com - ateliê@galveas.com)