sábado, 30 de março de 2013

Malhação de Judas

malhação de judas

Lá na esquina das Ruas Porto Alegre e Grão Pará, no alto do poste, ficava ele pendurado. O judas! Aos seus pés, uma placa implacável: “Seu Armando, do Armazém”. Quem mandava cobrar o pão tão caro!

Todo ano era assim. A tradição da malhação de judas, no Engenho Novo, sempre acabava em bate-boca. Tinha ano que era o Seu Nogueira, da Mercearia ou o Seu Wilson, da Padaria. E os comerciantes da região eram “torturados”, por volta do meio-dia, em meio as pauladas da meninada.

Eu não participava. Assistia de longe. Mas confesso que gostava. Acompanhava da varanda.

Depois do boneco ficar em frangalhos, a molecada ainda botava fogo! Um perigo. Mas naquela época Deus protegia. Ninguém cuidava e dava tudo certo. Estamos todos aqui para contar a história.

No subúrbio do Rio de Janeiro, era um costume nas manhãs de Sábado de Aleluia, aquele boneco pendurado no poste, esperando para ser trucidado. E com ele o povo tinha a oportunidade de protestar e incendiar o que lhe afligia. Era a nossa forma de protesto, ainda permitida, em anos de ditadura…

Ninguém ia muito longe. Não se falava (abertamente) mal do governo. Não se correria esse risco. Os judas eram os mais próximos, geralmente, da vizinhança. E todo mundo ia conferir logo cedo, o que a juventude preparava na calada da noite… A véspera era de expectativa.

Eu sei que meu pai também participava. Muitas vezes eu reconhecia a camisa do judas da vez. Saíra lá de casa!

Era uma farra. O representado em questão xingava a galera, mas ninguém ligava. O anonimato encobria. As fofoqueiras adoravam ter mais assuntos para falarem…

E aquelas manhãs, que antevinham ao domingo de Páscoa, ainda povoam as minhas lembranças com um quê de saudades…

judas

Mas quem é o “judas” de hoje que deveríamos malhar, hem???

3 comentários:

  1. Lindo texto, e já que hoje podemos falar, meu judas é o pastor homofóbico.

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  2. Lindo texto, e já que hoje podemos falar, meu judas é o pastor homofóbico.

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